domingo, 29 de agosto de 2010

LÓGICA, POLÍTICA E VIOLÊNCIA

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A política e a violência
Seja num bando, numa horda, num povoado ou numa Nação sempre haverá um líder orientando o grupo que controla as decisões e o destino do todo grupal. Entre os primatas o macho alfa atua como líder do bando, instituindo a hierarquia a ser seguida e dissuadindo os que, porventura, aspirarem à liderança. Normalmente a ordem vigente é controlada pela força do líder e o medo passa a ser a limitação necessária para a manutenção da estabilidade. Os privilégios concedidos ao líder e aos seus aliados lhes emprestam “status” e respeito, assegurando-lhes a autoridade sobre os demais.

Esse comportamento animal possui base instintual onde a sobrevivência e a reprodução representam um importante papel para a preservação da existência do grupo. O líder e seus aliados necessitam possuir características que tranqüilizem o bando e lhe assegurem os meios necessários a sua manutenção. A força e a argúcia são elementos importantes para a segurança do bando contra eventuais inimigos; a obtenção de alimentos é importante para a satisfação geral. Ambas conseguem manter o bando coeso e viável.

O padrão acima exposto indica que o comando, a economia e a capacidade de reprodução de um grupo animal são essenciais a sua existência como grupo. Um grupo sem comando, com fome, desprotegido e incapaz de reproduzir-se estará – no futuro – fadado ao extermínio, seja pelo ataque de outros grupos, pela inanição ou pela incapacidade de expandir-se numericamente.

Qualquer fragilidade na estrutura de uma organização social – pela ausência ou enfraquecimento de suas exigências básicas – facilitará a ruptura com sérias implicações para a sobrevivência do todo.


Comportamentos diante do Poder
Em zoologia, a Etologia é a disciplina que estuda o comportamento animal (do Grego ethos = ser profundo, logia = estudo). Está ligada aos nomes de Konrad Lorenz e Niko Tinbergen, sob influência da Teoria da Evolução, tendo como uma de suas preocupações básicas a evolução do comportamento através do processo de seleção natural. Segundo Darwin (1850, apud Bowlby,1982), cada espécie é dotada de seu próprio repertório peculiar de padrões de comportamento, da mesma forma que é dotada de suas próprias peculiaridades anatômicas. Os etólogos estudam esses padrões de comportamento específicos das espécies, fazendo-o preferencialmente no ambiente natural, uma vez que acreditam que detalhes importantes do comportamento só podem ser observados durante o contato estreito e continuado com espécies particulares que se encontram livres no seu ambiente.

Contribuições metodológicas da Etologia para a Psicologia

Hinde (1974 apud Carvalho, 1998) defende que os procedimentos de observação, descrição, experimentação e análise desenvolvidos para o estudo do comportamento animal podem ser utilizados no estudo do comportamento humano, com grande sucesso. Segundo Bowlby (1982), “a Etologia está estudando os fenômenos relevantes de um modo científico”. Segundo o mesmo, a abordagem etológica pode fornecer o repertório de conceitos e dados necessários para explorar e integrar dados e insights proporcionados por outras abordagens, como a psicanálise, a teoria da aprendizagem de Piaget e o que vem sendo denominado Neuroetologia no estudo comparativo e correlacional entre as distintas formas de sistema nervoso e suas funções e/ou comportamentos. O processo de elaboração de etogramas ou repertórios comportamentais é também um importante passo para o conjunto de técnicas behavioristas de modificação do comportamento.

Contribuições "práticas" para a Psicologia

Esse tipo de contribuição refere-se à possibilidade de utilização de resultados obtidos em estudos de comportamento animal para a complementação, confirmação e/ou aprofundamento de conhecimentos sobre o homem. Essa contribuição é especialmente útil em problemas nos quais a experimentação com humanos é impossível ou inconveniente, como os estudos de isolamento social em primatas não-humanos. Embora não se possam transpor resultados diretamente, dada a importância das diferenças interespecíficas, estes estudos enriquecem a compreensão sobre os seres humanos quando comparados com sujeitos em situações menos controladas, como estudos clínicos e observacionais. Entre os estudos mais relevantes até hoje apresentados estão os do fenômeno do Imprinting (Estampagem) descoberto inicialmente no comportamento das aves, mas atualmente já identificado em primatas.

Contribuição teórico-conceitual

A Etologia, enquanto abordagem do estudo do comportamento que se caracteriza por um enfoque biológico e, portanto, como área do trabalho científico, utiliza modelos e conceitos teóricos para a interpretação de seus fenômenos. Conceitos como estímulo-sinal, estímulo supranormal, estampagem e período sensível têm sido de grande importância no estudo da infância, possibilitado o aperfeiçoamento de escalas de desenvolvimento, por exemplo.

Contribuições sobre o conceito de Homem

A Etologia, segundo Carvalho (1989), tem contribuído para a recuperação da noção de homem como um ser bio-psico-social, abandonando a concepção insular do homem que dominou as ciências humanas (inclusive algumas áreas da Psicologia) na primeira metade do século XX, que destaca o homem da natureza e coloca-o em posição de oposição a esta. A concepção etológica do ser humano é a de um ser biologicamente cultural e social, cuja psicologia se volta para a vida sociocultural, para qual a evolução criou preparações bio-psicológicas específicas.
A evidência de um comportamento pode ser exemplificada pela existência de dois galos num conjunto de galinhas, frangos e pintos. A necessidade de liderança fará com que surja conflito entre eles. Haverá sempre um galo que vença e se torne o líder; e o outro que se submeta ou que seja eliminado pelo mais forte.

Interesses aninhados
A Sociologia é uma das ciências humanas que estuda as unidades que formam a sociedade, ou seja, estuda o comportamento humano em função do meio e os processos que interligam os indivíduos em associações, grupos e instituições. Enquanto o indivíduo na sua singularidade é estudado pela psicologia, a Sociologia tem uma base teórico-metodológica, que serve para estudar os fenômenos sociais, tentando explicá-los, analisando os homens em suas relações de interdependência. Compreender as diferentes sociedades e culturas é um dos objetivos da sociologia.
Os resultados da pesquisa sociológica não são de interesse apenas de sociólogos. Cobrindo todas as áreas do convívio humano — desde as relações na família até a organização das grandes empresas, o papel da política na sociedade ou o comportamento religioso —, a Sociologia pode vir a interessar, em diferentes graus de intensidade, a diversas outras áreas do saber. Entretanto, o maior interessado na produção e sistematização do conhecimento sociológico atualmente é o Estado, normalmente o principal financiador da pesquisa desta disciplina científica.
Enquanto os outros animais – guiados pelos instintos – possuem a capacidade de organizar-se para a preservação da espécie, o Homo sapiens diferenciou-se pela aquisição da cultura, da racionalidade e da religiosidade. Os sentimentos, princípios e valores são atributos humanos.

Chamamos de “comportamento humano” a uma forma especializada de relação que ocorre entre os seres componentes de um sistema cultural humano e que nem sempre segue as leis naturais (sociedade humana). Essa forma especializada determina uma ampla diversidade de culturas e comportamentos. Isso ocorre devido à “natureza avançada” dessas relações, onde atributos como: sentimentos, princípios e valores estão agregados às relações com o grupo e com o ambiente. Esses atributos podem modificar individualmente a resposta a um mesmo estímulo. O livre-arbítrio, aprendizagens diferenciadas e os estados reativos (comportamentos reativos) podem alterar as respostas.
Essas “aprendizagens diferenciadas” incluem os interesses de cada grupo de pessoas ou instituições, proporcionando a existência de Interesses aninhados, isto é, a mesclagem de interesses comuns a vários grupos. O grupo mais forte, que detém o poder, poderá cooptar em seu beneficio os demais que possuam objetivos semelhantes.

Instituição e violência - ganância e delírio


Um dos fenômenos marcantes do crescimento das populações ocorreu simultaneamente com a emergência das instituições e das classes dominantes. Surgiram grupos de pessoas (castas) que monopolizaram as decisões (políticos), a religiosidade (sacerdotes) e a segurança (militares) dos grupos sociais. Engendrou-se o conceito de hierarquia (verticalização do poder nas instituições).
Já vimos que o instinto de sobrevivência está fortemente vinculado à agressividade natural que, em condições antinaturais, pode gerar impulsos agressivos levando a destrutividade. Seres inteligentes não podem ser organizados como o são os objetos numa prateleira, nem divididos em classes de maior ou menor importância social. Sempre existiu uma correlação íntima e indissociável entre a atividade cerebral e a atividade grupal. É dessa dinâmica natural que se origina o fenômeno do comportamento individual vinculado ao grupo e da sua resultante – o equilíbrio grupal. Tentativas de separar essas duas partes interligadas, fatalmente resultarão no aparecimento de insatisfações e de comportamentos reativos entre indivíduos. É esse o centro gerador das violências e das alterações de comportamento que conhecemos, desde a Antigüidade até os dias atuais.
Quando os sentimentos, princípios e valores circulantes na sociedade e na família, em qualquer época, estimulam a mente para lutar por objetivos dissociados do bem estar do grupo, o indivíduo passa a associar individualismo com sobrevivência e a incorporar a competição como meio de alcançar seus objetivos a qualquer custo. A riqueza é uma dessas fantasias: o poder material a serviço do indivíduo! Nesse caso o grupo é sentido como “meio”, onde o indivíduo, usando das mais diferentes estratégias, deposita a esperança de “melhorar de vida”. Uma escada onde os degraus podem ser pessoas ou oportunidades de burlar as regras sociais.
As instituições podem representar o lugar onde se encontram as oportunidades, e a riqueza pode advir da capacidade de utilizá-la em proveito próprio, mesmo sabendo que é essa instituição um patrimônio do grupo e está a serviço dele. Isso pouco importa, pois os estímulos estão voltados para o bem estar pessoal, como é aprendido na Família e fora dela.

O capital como objetivo
Veja como o dinheiro é um forte indutor do comportamento: quando crianças e adolescentes somos totalmente dependentes dos pais. Isso nos força a pedir dinheiro a eles para satisfazer nossas necessidades induzidas pelo mercado. Depois que iniciamos a vida profissional, sobretudo nos primeiros anos, somos obrigados a obedecer nossos chefes em ordens que nem sempre concordamos. Isso porque precisamos “capitalizar” para nos sentirmos independentes.

Uma das mais antigas fraudes intelectuais é a de demonizar as palavras, subvertendo seu significado real. Os termos “capitalismo”, “imperialismo”, “sionismo”, “comunismo” e “socialismo” – entre outra tantas – possuem interpretação ampla com diversidade de emprego segundo as intenções de quem as utiliza.

Como dizia o poeta Ferreira Gullar, falando de sua desilusão com o comunismo, explica que “o capitalismo – “latu sensu” - é um fenômeno da natureza, enquanto o socialismo engendrado por seres humanos representa uma reação aos seus excessos.” O homem sempre quis controlar tudo. Até que um dia ele cresce, amadurece e sente necessidade de ser solidário e pacífico.

Na verdade o homem ainda não aprendeu a lidar com muito dinheiro. Há alguns milênios atrás as sociedades naturais já intuíam sobre o poder que o dinheiro exerce sobre os homens, na frase: “... a natureza humana é frágil. Os civilizados nunca conseguirão lidar bem com grandes doses de Poder”. E dinheiro é Poder?
A história humana mostra com fartura de exemplos que quando o homem conseguiu – pelo advento da Agricultura e da Domesticação de Animais – estocar alimentos iniciaram-se os conflitos para obter hegemonicamente o Poder sobre a “mais valia”; ao mesmo tempo surgiram a fraude, a mentira, os crimes e as teorias para proteger os marginalizados. O tempo passou e os faraós, reis e imperadores foram substituídos pelos ditadores modernos que, com os mesmos propósitos, inventaram as utopias para “proteger” os povos e desejar a hegemonia como forma de controle dos desassistidos e explorados.
Enquanto o homem não aprender a lidar adequadamente com o capital – como ferramenta de bem estar geral – continuarão a existir os radicalismos doutrinários, os conflitos que geram violência, pobreza e fome.

Perda do eixo cultural
As distorções do pensamento “socialista” que elege a competição entre as classes como mecanismo de compensação das inseguranças pessoais é uma lógica ridícula; estão presente nas sociedades sem eixo cultural. Isso não existe nas sociedades naturais.  Vou citar um exemplo que tem se perpetuado em quase todos os modelos que existem hoje em dia:

Quando uma sociedade se estratifica e se divide em classes sociais, privilegiando algumas delas em detrimento da maioria dos indivíduos, terá semeado certamente as condições favoráveis para a prática da violência. Não é difícil entender que o homem primitivo sobrevivesse da busca de alimentos que encontrava no meio ambiente. Seu grupo, como possuía normas coletivas de convívio, costumava repartir o produto dessa busca, pois os fundamentos da cultura preservavam sentimentos de solidariedade.

A sociedade civilizada não é uma cultura ou modelo cultural. Nessa sociedade a sobrevivência depende essencialmente em se ter emprego ou dinheiro para mantê-la. Para mim é um agrupamento de indivíduos que competem ferozmente pelo poder, pelo dinheiro e pela fama. Por incrível que pareça, esses conflitos geram lucros para algumas instituições e empresas e, algumas vezes, são forjados pelos governos e por alguns grupos ideológicos e empresariais com essa finalidade. Vivemos um clima de voracidade e competição.

Dissemos antes que o eixo dinâmico dos mecanismos da Natureza é a Interação! Dissemos também que o eixo central dos mecanismos interativos dentro de um grupo humano é o comportamento social. Se aceitarmos essas hipóteses, teremos de aceitar que, o que chamamos de Convivência, é o conjunto de comportamentos consensualmente aceitos dentro de um grupo humano. Quando admitimos que a organização dos bandos possui estrutura simplificada e é fundamentalmente instintual, voltada para os objetivos da sobrevivência e da reprodução, estamos querendo dizer que os estímulos motivadores dos comportamentos dos membros do bando possuem objetivos determinados: comer e reproduzir.

Em contrapartida, os objetivos determinados pelas culturas são tão diversos que seria difícil identificar todos. Afirmamos no início que o Eixo Cultural é o conjunto de regras, hábitos e costumes que mantém a qualidade dos comportamentos, a coesão e harmonia no grupo e no ambiente, isto é, sua estabilidade. Ora, se a organização dos bandos possui estrutura simplificada e, se o estímulo motivador das atividades dos membros do bando, possui objetivos determinados (comer e reproduzir), quais serão os estímulos motivadores em uma Cultura?

Vamos começar lembrando que uma cultura humana resulta da complexa interação entre diferentes comportamentos individuais. Que cada indivíduo é um “sistema pensante” único e que não visa apenas à sobrevivência e a reprodução. Todo indivíduo possui seus próprios interesses individuais, mas não perde a consciência de pertencer ao grupo. A associação em grupos determina não só a defesa dos próprios interesses, porque esses interesses podem coincidir ou divergir dos interesses dos outros membros do grupo.
Podemos usar termos como: “espírito de grupo”, “vontade grupal”, “inconsciente coletivo”, e tantos outros, para denominar uma direção, crença, ideologia, vontade ou desejo de grande parte dos membros de um grupo. Um indivíduo não vive sem esses atributos particularmente humanos. Todos vivem de projetos, sonhos, crenças e desejos. O mundo mental é virtual. A imaginação cria, e a vontade ou impulso (inconsciente) executa a maior parte dos nossos comportamentos. Temos que nos associar para conseguir alcançar o que não conseguiríamos atingir nunca, sozinhos. Essas características humanas criam uma dinâmica muito complexa dentro dos grupos.
Os estímulos motivadores dos comportamentos dentro de uma Cultura são inúmeros, porém o Eixo Cultural poderia ser compreendido como uma fusão de consensos dos membros de um grupo, algo que poderíamos chamar de Normas do Grupo ou Tradição Grupal. Essa tradição estaria representando a síntese de tudo àquilo que esse grupo acredita; sua alma, sua doutrina de vida, sua própria “identidade em grupo”. Estaríamos diante daquilo que resultaria num Modelo Cultural. Apenas as sociedades que conseguem conviver em equilíbrio (entre seus membros e com a Natureza) possuem Modelo Cultural. Não existe cultura civilizada, cultura brasileira, cultura alemã ou outra qualquer abstração que não funcione no “aqui e agora” da realidade. Um modelo cultural não se representa apenas como unidade lingüística, econômica, religiosa ou política. Deve, antes de tudo, possuir características de integração e estabilidade entre os membros e com seu suporte físico (ambiente). Acervo cultural sem eixo cultural integrado não é Cultura, é agrupamento. Reatividade individual e desequilíbrio social são fenômenos interligados que compõe um só quadro.
Lembrar sempre que o Homem não é criador e nem organizador da Natureza (Biosfera), e que é apenas uma pequena parte constituinte dela, pode se tornar útil para sobreviver no mundo real.


Casos da história
Se não tivesse sido capitalizado por banqueiros europeus Adolf Hitler jamais teria conseguido montar a fantástica máquina de guerra e propaganda antes e durante a segunda grande guerra mundial.

Se os babilônios, egípcios, romanos e demais sociedades antigas não cobrassem impostos e não engendrassem os saques a outros povos, não poderiam ter-se tornado impérios.

Se os fenícios através do seu comércio marítimo, não fossem exímios mercadores não teriam difundido o uso extenso do alfabeto como o ancestral de todos os alfabetos modernos. Não teriam sido os precursores do conceito de desenvolvimento comercial, aperfeiçoado depois pelos antigos gregos, que por sua vez, o repassaram para os etruscos e romanos.

Entre os índios não-aculturados a floresta é o supermercado de onde extraem a matéria-prima para a sobrevivência. Essa matéria-prima é manufaturada pelo grupo e transformada em alimento. Não há moeda e nem “mais valia” constituindo-se em uma economia de subsistência. O capital reside na obtenção do produto bruto que é transformado e imediatamente consumido. A comercialização entre grupos se restringe a um sistema de troca de objetos que não são produzidos dentro do grupo.

Desde a mais remota antiguidade os bens duráveis ou de consumo já existiam para atender as necessidades das sociedades até o aparecimento da moeda e da estocagem do excedente para ser comercializado.


MARGARETH MAHLER E ANTONIO GRAMSCI - SIMBIOSE E PODER
Margareth Mahler - (1900 — 1985), foi uma psicóloga americana que se distinguiu pelos seus estudos sobre psicose infantil.
 Antonio Gramsci (1891 — 1937) foi um político, cientista político, comunista e antifascista italiano.

O Desenvolvimento psicológico - perspectiva de Margareth Mahler

Mahler era uma pediatra que observou a relação que se desenvolvia entre a mãe e a criança, posteriormente tornou-se psicanalista para aprender mais sobre o assunto.  Afirmou que os recém-nascidos não conseguem distinguir-se de tudo o que os rodeia, vendo mesmo a mãe como parte de si. O desenvolvimento na criança de uma self independente passaria por três fases: autismo normal, simbiose normal e separação-individuação.

 A primeira fase é característica do primeiro mês de vida e podemos verificar que a mãe cuida da criança e supõe-se que esta atenda as suas necessidades. Esta não precisa realizar muitos esforços para ver as suas necessidades atendidas. Mahler designa esta fase por fase de narcisismo ou auto-absorção total.

    A segunda fase, simbiose normal, prolonga-se até aos quatro, cinco meses; aqui a criança começa a consciencializar-se dos objetos que satisfazem as suas necessidades, o objeto básico neste período é normalmente a mãe. A criança precisa progressivamente de dar mais sinais acerca das suas necessidades (por exemplo, fome, sede, desconforto), para a mãe as poder satisfazer.

  A última fase denominada de separação-individuação prolonga-se aproximadamente até os três anos. Nesta fase verifica-se uma separação psicológica da criança em relação á mãe e a formação de uma identidade pessoal. Este self independente posteriormente tornar-se-á na base para o estabelecimento de relações sadias na idade adulta.

  Realizando uma dualidade podemos verificar algumas analogias entre as fases de desenvolvimento de Mahler e as psicossociais de Freud na medida em que o grau de sucesso na passagem de uma fase para a outra vai determinar o desenvolvimento futuro da personalidade. A principal dissemelhança reside no fato de as fases de Freud envolverem uma energia sexual enquanto em Mahler encontramos estas envolvendo uma energia psíquica nas relações interpessoais e objetais(Schultz & Schultz, 2002).
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Antonio Gramsci - nasceu no norte da ilha mediterrânea da Sardenha. Era o quarto dos sete filhos de Francesco Gramsci, um homem que tinha vários problemas com a polícia. Sua família passou por diversas comunas da Sardenha até finalmente instalar-se em Ghilarza.
Tendo sido um bom estudante, Gramsci venceu um prêmio que lhe permitiu estudar literatura na Universidade de Turim. A cidade de Turim, à época, passava por um rápido processo de industrialização, com as fábricas da Fiat e Lancia recrutando trabalhadores de várias regiões da Itália. Os sindicatos se fortaleceram e começaram a surgir conflitos sociais-trabalhistas. Gramsci freqüentou círculos comunistas e associou-se com imigrantes sardos.
Sua situação financeira, no entanto, não era boa. As dificuldades materiais moldaram sua visão do mundo e tiveram grande peso na sua decisão de filiar-se ao Partido Socialista Italiano. Gramsci, em Turim, tornou-se jornalista. Seus escritos eram basicamente publicados em jornais de esquerda como Avanti (órgão oficial do Partido Socialista). Sua prosa e a erística de suas observações lhe proporcionaram fama.
Sendo escritor de teoria política, Gramsci produziu muito como editor de diversos jornais comunistas na Itália. Entre estes, ele fundou juntamente com Palmiro Togliatti em 1919 L'Ordine Nuovo, e contribuiu para La Città Futura.
O grupo que se reuniu em torno de L'Ordine Nuovo aliou-se com Amadeo Bordiga e a ampla facção Comunista Abstencionista dentro do Partido Socialista. Isto levou à organização do Partido Comunista Italiano (PCI) em 21 de janeiro de 1921. Gramsci viria a ser um dos líderes do partido desde sua fundação, porém subordinado a Bordiga até que este perdeu a liderança em 1924. Suas teses foram adotadas pelo PCI no congresso que o partido realizou em 1926.
Em 1922 Gramsci foi à Rússia representando o partido, e lá conheceu sua esposa, Giulia Schucht, uma jovem violinista com a qual teve dois filhos.
Esta missão na Rússia coincidiu com o advento do fascismo na Itália, e Gramsci - que a princípio havia considerado o fascismo apenas como uma forma a mais de reação da direita - retornou com instruções da Internacional no sentido de incentivar a união dos partidos de esquerda contra o fascismo. Uma frente deste tipo teria idealmente o PCI como centro, o que permitiria aos comunistas influenciarem e eventualmente conseguirem a hegemonia das forças de esquerda, até então centradas em torno do Partido Socialista Italiano, que tinha certa tradição na Itália, enquanto o Partido Comunista parecia relativamente jovem e radical. Esta proposta encontrou resistências quanto a sua implementação, inclusive dos comunistas, que acreditavam que a Frente Única colocaria o jovem PCI numa posição subordinada ao PSI, do qual se tinha desligado. Outros, inversamente, acreditavam que uma coalizão capitaneada pelos comunistas ficasse distante dos termos predominantes do debate político, o que levaria ao risco do isolamento da Esquerda.
Em 1924, Gramsci foi eleito deputado pelo Veneto. Ele começou a organizar o lançamento do jornal oficial do partido, denominado L'Unità, vivendo em Roma enquanto sua família permanecia em Moscou.
Em 1926, as manobras de Stalin dentro do Partido Bolchevista levaram Gramsci a escrever uma carta ao Komintern, na qual ele deplorava os erros políticos da oposição de Esquerda (dirigida por Lev Davidovitsch Bronstein e Zinoviev) no Partido Comunista Russo, porém apelava ao grupo dirigente de Stalin para que não expulsasse os opositores do Partido. Togliatti, que estava em Moscou como representante do PCI, recebeu a carta e a abriu, leu e decidiu não entregá-la ao destinatário. Este fato deu início a um complicado conflito entre Gramsci e Togliatti que nunca chegou a ser completamente resolvido. Togliatti, posteriormente, divulgaria a obra de Gramsci após sua morte, mas evitou cuidadosamente qualquer menção às suas simpatias por Trotsky.
Em 8 de novembro de 1926, a polícia italiana prendeu Gramsci e o levou a prisão romana Regina Coeli. Foi condenado a 5 anos de confinamento (na remota ilha de Ústica); no ano seguinte ele foi condenado a vinte anos de prisão (em Turi, próximo a Bari, na Puglia). Sua saúde neste momento começava a declinar sensivelmente. Em 1932, um projeto para a troca de prisioneiros políticos entre Itália e União Soviética, que poderia dar a liberdade ao Gramsci, falhou. Em 1934 sua saúde estava seriamente abalada e ele recebeu a liberdade condicional, após ter passado por alguns hospitais em Civitavecchia, Formia e Roma. Gramsci faleceu aos 46 anos, pouco tempo depois de ter sido libertado.
Leia mais: http://pt.wikipedia.org/wiki/Antonio_Gramsci
A guerra gramsciana tem como território as consciências. Deixemos que ele mesmo fale: “O Moderno Príncipe, desenvolvendo-se, subverte todo o sistema de relações intelectuais e morais, uma vez que seu desenvolvimento significa, de fato, que todo ato é concebido como útil ou prejudicial, como virtuoso ou criminoso, somente na medida em que tem como ponto de referência o próprio Moderno Príncipe e serve ou para aumentar o seu poder ou para opor-se a ele. O Moderno Príncipe toma o lugar, nas consciências, da divindade ou do imperativo categórico, torna-se a base de um laicismo moderno e de uma completa laicização de toda a vida e de todas as relações de costume”.
Baixe o arquivo do livro O Moderno Príncipe:
http://www.google.com.br/url?sa=t&source=web&cd=2&ved=0CB4QFjAB&url=http%3A%2F%2Fe-revista.unioeste.br%2Findex.php%2Ftemasematizes%2Farticle%2Fdownload%2F548%2F459&rct=j&q=O%20Moderno%20Pr%C3%ADncipe&ei=eOh4TJ7RO8H48Abe_tm2Bw&usg=AFQjCNFfZfR-braq8VDGedZ9G0cT3P6YCQ&cad=rja
Sobre Maquiavel (“os fins justificam os meios”)
Nicolau Maquiavel, em italiano Niccolò Machiavelli, (Florença, 3 de maio de 1469 — Florença, 21 de junho de 1527) foi um historiador, poeta, diplomata e músico italiano do Renascimento. É reconhecido como fundador do pensamento e da ciência política moderna, pelo fato de haver escrito sobre o Estado e o governo como realmente são e não como deveriam ser. Os recentes estudos do autor e da sua obra admitem que seu pensamento foi mal interpretado historicamente. Desde as primeiras críticas, feitas postumamente por um cardeal inglês, as opiniões, muitas vezes contraditórias, acumularam-se, de forma que o adjetivo maquiavélico, criado a partir do seu nome, significa esperteza, astúcia.
Niccolò di Bernardo dei Machiavelli viveu a juventude sob o esplendor político de Florença durante o governo de Lourenço de Médici e entrou para a política aos 29 anos de idade no cargo de Secretário da Segunda Chancelaria. Nesse cargo, Maquiavel observou o comportamento de grandes nomes da época e a partir dessa experiência retirou alguns postulados para sua obra. Depois de servir em Florença durante catorze anos foi afastado e escreveu suas principais obras. Conseguiu também algumas missões de pequena importância, mas jamais voltou ao seu antigo posto como desejava.
Como renascentista, Maquiavel se utilizou de autores e conceitos da Antiguidade Clássica de maneira nova. Um dos principais autores foi Tito Lívio, além de outros lidos através de traduções latinas, e entre os conceitos apropriados por ele, encontram-se o de virtù e o de fortuna.

Comentário meu:
Quando a fase de separação-individuação não se resolve adequadamente, prolonga-se até idade adulta, tornando o individuo dependente e não-produtivo. Passa a depender da família, do (a) parceiro (a) ou do Estado. Cria deuses e religiões para “salvá-lo” da morte e propiciar-lhe um segundo-tempo de vida: o tempo eterno. Torna-se parasita e alienado. Cria um ser superior por se sentir pequeno diante do espaço cósmico e da certeza da sua finitude.

Há dois tipos humanos: os que desejam um tutor ou provedor (os bolsa-família, alguns funcionários públicos, os bajuladores) para prestar-lhe obediência; há os que desejam ser autônomos, terem idéia própria e obedecerem a sua consciência.

 Enquanto Maquiavel defendia qualquer meio para alcançar o Poder, Gramsci preconizava que a “luta armada” não conduziria ao Estado Hegemônico. Seria necessário domesticar o povo durante longo tempo até que seus desejos e aspirações se alinhassem aos objetivos do partido único controlado pelo Estado.
Mitologia, mitomania e poder

A mente humana sempre perguntou "Por quê?" Essa tem sido a pergunta-base para a compreensão do mundo desde tempos muito remotos. O mito é uma alternativa de resposta a essa pergunta no espaço mental que trata dos seres sagrados, divinos ou deificados, num tempo em que o mundo era diferente, e diz como, através da ati­vidade destes seres, as coisas vieram a ser como são. Ele mostra aos humanos aquilo que deve ser feito para manter a Vida em harmonia e as origens das coisas que existem, com simbologia inerente ao grupo que o cria. É uma forma simbólica de estruturar uma narrativa, onde a religiosidade, a magia e o cotidiano se misturam para explicar as origens e os mistérios da tradição. Uma forma de organizar e fundamentar os costumes, as normas e crenças; organizar os indivíduos para as finalidades sociais, para a solidariedade e para a unidade grupal. Um instrumento mágico-ético-moral da esfera mental.

A religiosidade, magia e realidade se fundem num mito e num ritual e são expressões de solidariedade social e crença coletiva. Os seres humanos so­zinhos nada são. Eles alcançam signi­ficação e importância somente como membros de um grupo social. Os rituais sagrados e as crenças simbolizam a mente extra-temporal da sociedade. Da experiên­cia ritual surge o contato entre o sagrado e o profano, que alimenta a crença e produz a realidade.
A ênfase religiosa no sobrenatural leva à subordinação dos homens aos deuses e ao poder das pessoas que representam o culto ‑ o feiticeiro e o sacerdote. A religião é muito mais centralizada do que a magia a qual é essencialmente mais individua­lizada. Embora as religiões organizadas sempre usem um pouco de magia nos seus rituais, as igrejas são visceralmente contrárias à magia, uma vez que a atitude de magia é incompa­tível com a atitude religiosa de submissão.

A religião e a magia são fontes de poder; são meios de influenciar ou controlar o poder sobrenatural, o maior de todos os poderes. A autoridade representativa de que são investidos os executores do sobrenatural (sacerdotes, magos, feiticeiros) é necessária para a evolução da cultura em certos povos. Essa é uma razão especial para manter o poder religioso nas mãos desses representantes nas sociedades equilibradas. Porque, nessas sociedades, o poder é apenas de representação, não de poder real.

Dissemos antes que os estímulos motivadores dos comportamentos numa Cultura são inúmeros, porém o Eixo Cultural poderia ser compreendido como uma fusão de consensos dos membros de um grupo, algo que poderíamos chamar de Tradição do Grupo. Essa tradição estaria representando a síntese de tudo aquilo que esse grupo acredita; sua alma, seus costumes, sua própria “identidade em grupo”. Estaríamos diante daquilo que resultaria num Modelo Cultural. Os mitos, reunidos, são o contexto histórico do modelo cultural que explica a tradição. 

Nas comunidades naturais o poder emana da Lei-Tradição (ancestralidade, espiritualidade) e é evocada pelo líder, com freqüência, para ser aprendida pelo grupo, tornando-se consensual. Mas o líder não possui “poder de mando” porque os mitos e seus conteúdos não pertencem aos vivos. O grupo concede aos líderes (chefe, pajé) o “prestígio de representação” e lhes nega a “função de poder” para evitar o “abuso de poder” e o aparecimento da violência. Esse é o princípio da liberdade comunitária: tornar o poder impessoal (tradição) para excluir a vontade pessoal (caráter infrator, coerção, violência).

Os povos das sociedades naturais “descobriram” (intuíram) que o indivíduo é frágil e o grupo é forte. Que não é dado, aos seres humanos, o privilégio de conduzir o destino do conjunto social. “O homem nunca estará preparado e seguro para lidar com grandes doses de poder sobre os demais”, devem ter pensado. Engendraram o poder tradicional para organizar a vida social e delegaram aos membros mais confiáveis, apenas “o prestígio de representação”. Esse “prestígio” pode se esgotar e o líder ser esquecido se, ele próprio, se afastar dos preceitos tradicionais. Voltará a ser um cidadão comum. Os preceitos tradicionais resumem aquilo que chamamos de Constituição ou Carta Magna.

Nessas condições, admite-se que os conteúdos psíquicos dos indivíduos dentro de uma sociedade natural sejam guiados por normas oriundas da crença tradicional, ou seja, desprovidas de interferências individuais, propiciando a expressão de comportamentos ativos (construtivos). A utilização generalizada de sentimentos, princípios e valores de caráter comum (solidariedade, generosidade, ética grupal), poderia explicar esse conteúdo construtivo da conduta e da personalidade dos indivíduos nessas comunidades através do conjunto representado por seu modelo cultural, onde os mitos atuam como eixo mental do grupo, ordenando os comportamentos. Portanto, quem manda nos indivíduos são suas crenças e não seus chefes. Cada um se dirige por si (por seu bom-senso) e todos estão sujeitos à tradição. Essas são as sociedades que não necessitam do Estado para sobreviver e conviver. São sociedades sem-Estado.

Mitomania quer dizer: Tendência para a mentira, à fabulação e a simulação. Inventar o que não existe, com diferentes finalidades, sem acreditar nelas. Nos casos patológicos o mitomaníaco (mentiroso) não mais consegue separar verdade de mentira.

Dissemos que agrupamento é uma forma de associação humana que enfraqueceu ou perdeu sua identidade cultural, suas tradições (hábitos e costumes) e substituiu o “consenso grupal” por formas de organização social não-integradas e estimuladas pela competição entre seus membros. O agrupamento humano, forma de associação sem modelo cultural, surgiu com o advento da Civilização, e tem provocado sensíveis alterações na convivência. A forma organizacional dessas associações desestruturou as relações humanas de grupo coletivo, criando aspirações individuais de conteúdo materialista. Os mitos, que representam o eixo mental do grupo natural, no agrupamento civilizado, passaram a não mais existir como eixo ordenador dos comportamentos. Portanto, quem manda nos indivíduos são suas instituições e seus chefes. O Estado, as leis, as religiões e as empresas passaram a controlar o imaginário individual, direcionando-o para a posição de consumo, representada pelos bens materiais; para a busca de “salvação” da alma, dirigida pela religião; pela ascensão de “status” e poder, representada pela fama e pelo controle político-institucional. Essas talvez sejam maneiras de compensar e de mitigar a insegurança individual, em pessoas que não a encontram mais sob forma grupal estruturada.

Diferentes conceitos humanos modificados pelo processo civilizatório dinamitaram a ideologia mitológica e pulverizaram a Tradição. Substituímos essas poderosas forças de coesão social por outros conceitos (Constituição, Justiça, Seguridade, Propriedade, etc.), nos quais não acreditamos nem respeitamos. Eles não são verdadeiros para nós – embora os desejemos - porque não correspondem à realidade que assistimos. Eles se originam do artificialismo institucional dirigido pela fragilidade do caráter humano. A “ideologia mitológica” e a “tradição” são representações internas da mente humana. Nas sociedades naturais estão fundamentadas pela crença absoluta na “verdade mítica”, orientadas para a direção sensata do bem estar de todos. A verdade mítica prescinde da existência externa de mecanismos institucionais porque engloba e sintetiza direitos e deveres dos indivíduos na relação social, expressando-os através de linguagem simplificada (parábola = mito).

Há quem dissocie as parábolas bíblicas dos mitos indígenas, como se fossem linguagens distintas. Há também quem dissocie as palavras de Jesus e dos profetas, das palavras dos líderes indígenas, que cumprindo a tradição são obrigados a exercitar sua preleção diária para o grupo. A Palavra é detentora de grande fascínio e poder entre humanos. Não serve apenas para expressar idéias e sentimentos. Muito mais do que isso, possui características indutoras do comportamento, ainda pouco compreendidas por nós. Isso fica claro quando assistimos massas humanas humildes “hipnotizadas” pelas palavras de falsos líderes religiosos e políticos, em busca de riqueza e salvação. Os fanatizados se suicidam ou matam.

Nas sociedades naturais, a Palavra-Lei-Tradição (palavras proferidas pelo cacique todo dia no centro da aldeia e pelo pajé nos rituais) é diferente da palavra comum usada por todos. Da mesma forma - e por analogia - entre os brancos, o valor da palavra, se torna mais perceptível nas frases: “Homem de palavra”, “Palavra de Deus”, “Para um bom entendedor meia palavra basta”, etc.

Nas sociedades naturais, só o chefe indígena (para lembrar a tradição terrena) e o pajé (para lembrar a tradição espiritual) são detentores do prestígio e poder de uso da Palavra-Lei-Tradição; ao mesmo tempo lhes é negado (e a todos) o uso da Palavra-Ordem-Obediência. O mistério, exótico e apenas aparente, desses costumes nos mostra a sabedoria contida no seu cerne. No primeiro caso, a Palavra-Lei-Tradição representando a coesão, união e harmonia, isto é, a ausência de poder de uns sobre os outros no grupo; em última análise, a ausência da violência, da marginalidade e da miséria pela inexistência de um poder centralizado e coercitivo. No segundo caso, a negação do uso da Palavra-Ordem-Obediência, para não permitir o uso do poder, da violência e da diferença social e antinatural das classes sociais.

O “prestígio de representação” social entre os índios (chefe, pajé ou líder) proíbe o uso do poder na competência (de dar ordens), assegurando assim a liberdade do grupo. A palavra comum é de todos, mas assume conotação sagrada e de prestígio quando empregada por representantes, que apenas podem invocá-la para lembrar e fazer cumprir a Tradição. A Autoridade é a Tradição. Seus líderes são apenas representantes transitórios dessa autoridade tradicional, mas não serão respeitados se derem ordens. A verdadeira Autoridade para eles é filha do “respeito ao outro”, que é filho da Admiração; da verdadeira admiração por quem não precisa usar o poder e a violência da coerção. O bom caráter da Autoridade constrói o Respeito, que alimenta a admiração, que admira o bom caráter (prestígio) da Autoridade. É preciso dizer que o autoritarismo (autoridade violenta e punitiva) destrói a admiração e suprime a autoridade. Todo déspota, pela falta de autoridade que percebe em si mesmo, realimenta a opressão e recebe como resposta, mais cedo ou mais tarde, a reação infratora dos oprimidos.

A mitomania, entre nós, parece ser uma anomalia resultante do que o processo civilizatório criou na mente; uma busca de equilíbrio mental, na desordem social dos dias atuais, que continua camuflando a sintonia real na convivência.

Marketing: um conceito controverso



Riqueza, poder e prestígio costumam associar-se à mentira, hipocrisia e violência. Onde o “ter” e o “consumir” forem estímulos propulsores de comportamento da maioria, certamente teremos instalado o conflito e a reatividade. As expressões “cada um por si e Deus por todos”, “salve-se quem puder...” e “pouca farinha meu pirão primeiro” definem com cristalino apuro as relações circulantes em nossa sociedade “avançada”. Quando a palavra é acrescida de outros recursos sofisticados como imagem, animação, efeitos especiais e som, a mente se anestesia, diminuindo o juízo crítico.

O mundo virtual criado pelas mídias pode estimular a crença em falsos valores e expectativas desejadas, que podem se tornar uma promessa de realidade. Assim é o mundo virtual dos nossos dias, onde as promessas alimentam os sonhos, que realimentam a alienação. Onde o comportamento alienado, quase sempre deságua na decepção, na insatisfação, na incerteza.
Como os felinos preparam armadilhas com diversas artimanhas, escondidos atrás das moitas, para apanhar suas presas, as mentiras e a dissimulação dos marqueteiros esperam suas vítimas para saciar sua fome de riqueza, prestígio e poder. Somos os mais ferozes dos animais. Enquanto os felinos saciam sua fome para sobreviver, nós atacamos de estômago cheio.

Convencimento e mentira são recursos utilizados pela propaganda enganosa para estimular o consumismo, destruindo verdades e construindo falsidades, através de novas palavras e lógicas pseudocientíficas e místicas (sofismas). Nichos lucrativos podem se apresentar sob diferentes formas: planos de saúde, religiões barulhentas, produtos milagrosos, técnicas de ajuda, ideologias de igualdade social, etc.

Apesar da precariedade da convivência, ainda possuímos a alternativa de convívio comunitário. Vida comunitária é “eixo cultural”, é projeto de vida em grupo, que promove mudanças ativas na configuração do psiquismo. Depende de estímulos que formem base real voltada para o benefício do todo, sem mentiras entre as partes. Não comporta fraude ou dissimulação intermediando o relacionamento.

Os avanços tecnológicos conquistados pelos homens nos últimos tempos, além da grande utilidade, facilitam a comunicação entre as pessoas e remetem para a máquina os trabalhos mais penosos e monótonos. Porém, sua utilização, a intencionalidade do seu uso, mostra que ainda temos muito que aprender para nos tornarmos realmente justos e felizes.


Conclusão:

Não é certo que o progresso científico e tecnológico seja o responsável pelo declínio na convivência. Não há relação direta entre essas coisas! Talvez devamos procurar essa relação nos locais mais profundos da nossa consciência. Podemos usar todo o nosso tempo de vida em busca dos sonhos estimulados pelos valores da sociedade em que vivemos. O tempo nos dirá se eles eram reais ou apenas ilusões.

Penso haver duas afirmações que determinam o COMPORTAMENTO como fator gerador dos fatos e dos discursos. Ambos os pensamentos abaixo poderiam sintetizar o segredo da CONVIVÊNCIA:

“O comportamento dos dirigentes determina a qualidade da vida em sociedade” ou “Quando o maestro não possui qualidades para reger, a orquestra desafina e a música torna-se insuportável”.

Um abraço!